Sem debate de propostas nem renovação política, a principal promessa eleitoral no Distrito Federal é "não roubar".
Faroeste
Caboclo: Com candidatos envolvidos em casos de corrupção, ataques aos
adversários e promessas de um governo honesto viram pano de fundo de
campanhas.
(Da esq. para a dir.) Os candidatos ao governo do Distrito Federal:
Rodrigo Rollemberg (PSB), Agnelo Queiroz (PT) e José Roberto Arruda (PR)
durante debate
“É uma política de faroeste, mas a gente não encontra o mocinho", Paulo
Kramer, cientista político da Universidade de Brasília (UnB).
Há mais de uma década, o eleitor do Distrito Federal acostumou-se ao
lamentável roteiro de ver seus governadores, assessores e deputados às
voltas em escândalos de corrupção. O primeiro senador cassado desde a
redemocratização do país, Luiz Estevão, foi eleito pelo Distrito
Federal. O primeiro governador preso, José Roberto Arruda, também.
Arruda, aliás, é um dos protagonistas das eleições deste ano e lidera as
pesquisas de intenções de voto pelo Partido da República (PR). Disputa o
cargo com o enrolado governador Agnelo Queiroz, do PT, alvo de três
investigações sigilosas no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Depois de participar da violação do painel eletrônico no Senado, em
2001, quando renunciou ao mandato para evitar um processo de cassação,
Arruda foi flagrado em vídeo recebendo dinheiro de propina no escândalo
conhecido como mensalão do DEM, em 2009. Acabou encarcerado por dois
meses, mas isso não o impediu de voltar à cena política. O ex-governador
teve o registro cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e pelo
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e aguarda uma definição do Superior
Tribunal Federal (STF) sobre a possibilidade de disputar as eleições.
Enquanto isso, segue em campanha, afirma ter sido vítima de um golpe, e
promete um governo livre de corrupção.
Nestas eleições, Arruda concorre com o apoio de outro ex-governador
cuja trajetória também acabou em páginas policiais de jornais. Joaquim
Roriz, com base eleitoral nas cidades mais pobres do Distrito Federal,
governou a capital do país quatro vezes e agora, impedido de disputar as
eleições por ser ficha-suja, tenta manter a influência indicando cargos
de confiança em uma eventual gestão Arruda. Além de herdeiros
políticos, como o senador Gim Argello (PTB) – que responde a três
inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) –, Roriz lançou a mulher,
Weslian, como candidata à primeira suplente do Senado. A família também
vai às urnas com as filhas Liliane e Jaqueline Roriz, o sobrinho Dedé
Roriz e o neto, Joaquim Roriz Neto, que tentam vagas na Câmara
Legislativa e na Câmara Federal.
“O Distrito Federal carrega essa mácula da velha política. Brasília são
duas cidades: uma na Esplanada dos Ministérios, a da representação
oficial, e outra que ainda guarda uma característica de fronteira e
atrai muitas pessoas a tentarem a vida aqui”, avalia Paulo Kramer,
cientista político da Universidade de Brasília (UnB). “A política não
deixa de refletir essa realidade: é uma política de faroeste, mas a
gente não encontra o mocinho.”
Telhado de vidro – Suspeitas de corrupção também cercam o segundo
colocado na corrida, Agnelo Queiroz, citado no esquema de desvio de
dinheiro do programa Segundo Tempo, do Ministério do Esporte, pasta que
comandou entre 2003 e 2006. Não para aí: ele também é investigado em
esquema de fraudes e cartel durante sua gestão como diretor da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e nas ações que levaram à
prisão do contraventor Carlinhos Cachoeira. Mas seu lema é que “a
sujeira e a corrupção não podem voltar a ser a marca do DF”.
Se a ascensão de Arruda reflete uma síntese do atraso da política
brasiliense, também é reveladora do descontentamento da população com o
atual governo de Agnelo, cuja taxa de rejeição é de 43%. Governada por
um médico, a capital do país é a unidade da federação que mais investe
em saúde por ano – tem um gasto anual de 1.042,20 reais por pessoa –,
mas registra o pior número de leitos e o mais baixo índice de cobertura
em setores da atenção básica, agentes comunitários e equipes de saúde da
família, segundo o Conselho Federal de Medicina. A situação se repete
na educação, com índices de aprovação dos ensinos médio e fundamental em
queda, na segurança pública, cujo número de furtos e roubos é
crescente, no trânsito caótico no Plano Piloto e na descontrolada
invasão de terras.
No entanto, em vez de discutir os problemas crônicos da cidade, os
principais embates entre os candidatos levam o eleitor a um duelo onde
imperam ataques e faltam propostas. Na última segunda-feira, o tema
corrupção pontuou o debate promovido pelo SBT. “É impressionante o
desprezo com a inteligência do povo do Distrito Federal. O Arruda é o
discípulo da inverdade e ele continua com a velha maneira de fazer
política”, disse Agnelo. A resposta veio no mesmo tom: “Agnelo, vejo
você trêmulo e nervoso porque o seu governo foi um desastre. Quando eu
vejo você falar de corrupção eu acho que você está olhando no espelho”.
“O Distrito Federal vive uma situação desmoralizante na política e nos
serviços públicos. Os candidatos se concentram apenas em troca de
acusações, e o prejuízo fica para o eleitor, que não é apresentado às
propostas para reverter os principais problemas da cidade no ano que
vem”, avalia David Fleischer, cientista político da UnB.
Terceira via – Empatado com Agnelo Queiroz nas pesquisas, o senador
Rodrigo Rollemberg (PSB), que nunca exerceu um mandato no Executivo,
preparou um bordão para se colocar como terceira via nas eleições deste
ano: “Brasília não merece nem incompetência nem o ‘rouba mas faz’”.
Ainda assim, o socialista está longe de ser uma renovação política:
iniciou a carreira pública em 1995, na Câmara Legislativa, passou pela
Secretaria de Turismo durante o governo do então petista Cristovam
Buarque e foi aliado de Agnelo Queiroz até dezembro de 2012, quando
desembarcou do governo para ajudar nos primeiros passos pela candidatura
de Eduardo Campos à Presidência da República.
As alianças com a velha política que domina o DF se repetem nos outros
dois principais candidatos, que também se colocam como renovação: o
deputado Luiz Pitiman (PSDB) foi presidente da Companhia Urbanizadora da
Nova Capital (Novacap) no governo de Arruda e, depois, secretário de
Obras de Agnelo. O candidato Toninho do Psol, até os anos 2000,
disputava as eleições como o Toninho do PT.
Sem debate de propostas nem renovação política, a principal promessa eleitoral no Distrito Federal é "não roubar".
Fonte: Por Marcela Mattos - Revista VEJA.
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