Marina
Silva concorreu à Presidência da República em 2010 pelo PV e teve quase
20 milhões de votos, votação considerada decisiva para forçar o segundo
turno entre Dilma e o tucano José Serra
“No
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as favas já estão contadas, e a
sorte da Rede, selada. Seu partido ficará para depois. A decisão do TSE
irá confirmar ao final que Marina Silva
tem, de fato, não um partido, e sim, ainda, uma ONG”. A análise é do
jornalista Antonio Lassance, em artigo publicado na agência brasileira
de notícias Carta Maior.
Leia, a seguir, os principais trechos do artigo:
A
única dúvida que resta é se a Rede conquistará pelo menos um voto. Uma
das esperanças, talvez a única, é o ministro Gilmar Mendes. Dias
Toffoli, o ministro “caixinha de surpresas”, viajou e cedeu a vez,
providencialmente, para Mendes, defensor explícito da Rede. Mesmo assim,
no TSE e no STF, o que se diz é que Mendes seguirá o voto da relatora,
ministra Laurita Vaz, mas fará um veemente protesto sobre a rejeição
supostamente exagerada de assinaturas por cartórios. Mendes pode assim
proporcionar à Rede mais um vídeo no Youtube.
O
iminente tropeço na criação da Rede mostra o quanto Marina Silva se
divide entre dois mundos: o dos partidos e o das ONGs. Um dos problemas
no processo de constituição da Rede foi exatamente o de que sua
organização se comportou, o tempo todo, mais como ONG do que como
partido. Mais cedo ou mais tarde, a Rede será criada e Marina Silva terá
sua sigla ou, melhor dizendo, sua marca de fantasia, ao gosto de sua
“sonhática”. A questão agora é saber o que prevalecerá na discussão de
seu plano “B”: seu lado ongueiro ou os apelos partidários.
O
resultado da disputa dirá se Marina é carta fora do baralho em 2014 ou
se estará na disputa. A alternativa posta a seus pés é a de ingressar em
um partido pré-existente, como Partido Ecológico Nacional (PEN), nanico
(de seus dois deputados, pelo menos um já estava de saída),
inexpressivo e cuja executiva nacional é formada por vários membros de
uma mesma família. De todas as opções possíveis, seria a mais
inofensiva.
A
sigla foi oferecida a Marina para dela fazer o que achar melhor, se
tornando presidente do partido e candidata à Presidência da República. É
tudo o que o PEN precisa para escapar da extinção. Aliás, até a
extinção é aceita de bom grado, pois o presidente nacional do PEN já
sinalizou que, quando a Rede estivesse criada, as duas siglas poderiam
ser fundidas em uma só. Por Marina, o PEN faz qualquer negócio. A
recíproca não é verdadeira. Com a reputação que conquistou a duras
penas, Marina tem receio de queimar seu filme, mesmo que no papel de
protagonista.
O PEN pode recolocar Marina no jogo para 2014.
Mas, de novo, o dilema entre ser ou não ser é a questão. Melhor
aguardar 2018 e cumprir o figurino do marketing armado em torno da Rede,
ou cumprir as formalidades e pegar uma sigla que está à mão? Melhor
mostrar desprendimento e prioridade ao projeto? Ou reafirmar o que a
Rede de fato é: o partido dos marinheiros, da Marina, pela Marina e para
a Marina? Ao mesmo tempo, o que melhor define a Rede não é seu
programa, e sim a biografia de sua pré-candidata.
Eis
o dilema: a intrépida trupe da Rede sairá pela tangente ou refugará
solenemente o mundo partidário atual, que, mesmo com 32 partidos, seria
pequeno demais para caber Marina Silva?
A
pré-candidata, talvez ex-candidata, decidirá o seu destino ouvindo dois
campos bem distintos de pessoas ao seu redor, com cabeças muito
diferentes. Vencerá quem fizer mais pressão e quem ganhou mais
proximidade na trajetória trilhada por Marina desde que ela saiu do
Governo Lula, em 2008.
De
um lado, está a turma que acompanha Marina desde o Acre e que veio
acompanhá-la em seu mandato de senadora. A esse grupo juntaram-se
políticos desgarrados de outros partidos, mas que dela se aproximaram,
uns desde 2010, alguns há poucos meses. De outro lado, a tropa de
ongueiros que vem da militância ambientalista e que aos poucos se
assenhorou da carreira de Marina Silva.
Na
primeira presidência Lula (2003 a 2010), Marina levou ambos os lados
para o Ministério. O grupo partidário da ex-senadora aos poucos se
enfraqueceu e foi isolado na definição da política de meio ambiente
implementada pelo Ministério. O campo petista ligado a Marina perdeu a
batalha para o grupo das ongs, ligado principalmente à WWF (World Wide
Fund for Nature). Os ongueiros passaram a prevalecer na política, na
ocupação dos cargos, na ascendência sobre a ministra e, mais importante,
no enfrentamento à política de desenvolvimento do País. O ambientalismo
conservacionista, que sempre foi muito próximo à ex-ministra,
desgastou-a por completo no Governo Lula e levou a própria política
ambiental ao isolamento, dentro e fora do governo.
Marina
perdeu espaço em sua própria região. Basta ver o mapa dos votos de
2010, que mostra o quanto sua votação, inclusive proporcionalmente, foi
maior quanto mais distante esteve da Região Amazônica. O viés
conservacionista, contrário a algumas políticas de desenvolvimento para a
Região Amazônica; a tônica repressiva (emblemática na operação Arco de
Fogo); a indisposição do MMA com vários outros ministérios e com o
próprio presidente Lula; até mesmo a criação do Instituto Chico Mendes,
que revoltou os servidores do Ibama, que viram seu órgão enfraquecido e
esvaziado, formaram um rosário de problemas que redundaram na saída de
Marina do cargo de ministra e, depois, do PT.
Essa
experiência foi um divisor de águas na trajetória da ex-senadora e
contribuiu para jogá-la no campo de oposição ao PT, a Lula e a Dilma.
Dramática, no início, a linha agressiva dos ongueiros aos poucos pareceu
render frutos. O PV a abrigou. A velha mídia a colocou debaixo do
braço, como a um neném na incubadora.
Setores
empresariais se aproximaram, financiaram sua campanha, pagaram seus
marqueteiros. Vieram os consultores para escrever seu programa (como
Eduardo Giannetti da Fonseca, autor do best-seller “Auto-engano”, que
costuma ser encontrado em livrarias na seção de auto-ajuda). Os partidos
de oposição têm uma grande dívida com os marineiros por terem provocado
o segundo turno nas eleições presidenciais de 2010.
A
candidata surpreendeu, alcançando uma votação expressiva. Depois
daquelas eleições, surgiu outra Marina Silva. Ela mudou de tamanho e,
aos poucos, ganhou uma nova “entourage”.
As pressões para se manter a candidatura, custe o que custar
Para
a Rede, esta quinta-feira tem tudo para ser dia de choro e ranger de
dentes. O sistema eleitoral deve ser amaldiçoado por eles que lutaram
até o último momento para serem reconhecidos (e o serão, em breve) por
esse sistema injusto e viciado.
O
dia seguinte deve ser dedicado a ouvir “as bases”. Essas bases, no caso
dos marineiros, são os políticos, os ongueiros e, agora, com força, o
setor empresarial e midiático.
A
turma da política que tem mandato parlamentar terá sérias dificuldades
para usar a grife Marina Silva, mesmo que ela vá para o PEN. Pela
jurisprudência do TSE, só se admite que um parlamentar deixe um partido
por situações que configurem uma justa causa. Uma delas é a de ingressar
em um partido novo. Um partido é considerado novo apenas durante trinta
dias, contados a partir do registro de seu estatuto. O PEN já não é
mais um partido novo. Os parlamentares que nele ingressarem deverão
justificar outras razões, e rápido, para trocar de legenda e não
sofrerem o risco de terem o atual mandato cassado.
Heloísa
Helena não teria tantos problemas. Eleita pelo PSOL, adoraria perder
seu mandato de vereadora em Maceió e voltar à cena nacional, como
senadora. Domingos Dutra tem razões suficientes para justificar sua
saída, em função de sua persistente e extenuante guerra de Davi contra
Golias contra a família Sarney, no Maranhão. Miro Teixeira talvez seja o
em situação mais complicada, pois apenas recentemente resolveu soltar o
verbo para se livrar do PDT. Reguffe, do DF, fez algumas sinalizações
para a Rede, mas assim como Miro, está de olho em tempo de TV (que no
PEN seria diminuto). Para os que sairão candidatos a deputado, se
estiverem soltos, sem alianças, há o problema extra dos coeficientes
eleitorais.
A
opção para preservar o nome Marina Silva tem prevalecido entre os
ongueiros da Rede. Os políticos pressionam para que ela saia candidata,
custe o que custar. Pela primeira vez, a turma dos políticos próximos a
Marina tem chance de prevalecer, pois contam com dois pesos pesados em
favor de disputar 2014: a mídia conservadora e alguns setores do
empresariado ávidos por derrotar o PT, ou, pelo menos, levar a disputa
para o segundo turno.
A
decisão final será da própria Marina. Para encarar 2014, ela precisará
deixar de lado a preocupação de sair da campanha menor do que entrou,
que é um grande risco; terá que simular uma espécie de candidatura
avulsa, como se corresse na raia de fora do sistema eleitoral
tradicional, arcando com o ônus que isso acarreta, pela dificuldade de
estrutura, mas com o bônus de imagem de estar por baixo em um sistema
eleitoral que a candidata reputará, como dizem, injusto e viciado.
Na
Rede, o jogo está empatado. O que pode fazer Marina pender para um ou
outro lado será a pressão que sofrerá de fora, por parte daqueles que
têm condição de recompensar sua campanha com maciço apoio empresarial e o
peso da mídia tradicional.
Fonte: Correio do Brasil.
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