Petistas, mensaleiros e até líderes partidários contribuíram para livrar deputado de cassação
Depois de uma votação secreta, que manteve o mandato do
deputado-presidiário Natan Donadon (sem partido/RO), a quinta-feira foi
de reações nos corredores na Câmara, nas redes sociais e na sociedade
civil, aumentando a pressão pelo fim do voto secreto na Casa. Para
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a decisão é
inconstitucional: Donadon foi condenado por peculato e formação de
quadrilha, mas também teve os direitos políticos suspensos — manter o
mandato, portanto, foi uma afronta à decisão do Supremo.
O presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB/RN), afirmou que, na
próxima terça-feira, vai pedir à comissão especial da Casa que coloque
em votação a PEC 196, para cassação automática de parlamentares por
condenação criminal ou falta de decoro. A PEC foi aprovada em dois
turnos no Senado e passou pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)
em junho. A comissão especial, no entanto, não levou o projeto adiante.
— Diz o ditado popular que há males que vêm para o bem. Vamos ver se
esse episódio (da absolvição de Donadon), que, a meu ver, fragilizou a
Câmara, produz uma coisa boa e positiva: a consciência de que esse tipo
de processo não pode ser pelo voto secreto. Essas posições têm que ser
claras. Não colocarei mais processo de cassação sob o manto do voto
secreto.
A proposta, no cálculo de Alves, deverá ser votada pela comissão
especial até setembro. Se for aprovada, seguirá para dois turnos de
votação no plenário. Se a comissão retardar a análise do texto, o
presidente da Câmara afirmou que vai trabalhar para aprovar outra PEC, a
que estabelece que todos os votos do Congresso têm que ser abertos.
Neste caso, faltam uma votação em segundo turno na Câmara e a apreciação
do Senado.
A votação terminou em 131 votos contra a cassação, 233 a favor e 41
abstenções (para a perda do mandato, seriam necessários 257 votos). Os
números mostram também o descompromisso dos deputados com a votação do
pedido de cassação do colega. A lista dos ausentes na sessão de
anteontem à noite na Câmara chegou a 108 deputados, entre eles três
líderes partidários: Beto Albuquerque (PSB) , Jovair Arantes (PTB) e
Eduardo Sciarra (PSD).
Acordo para salvar ‘bagrinho’
A não cassação de Donadon começou a ser desenhada na semana passada,
durante votação do parecer pela perda do seu mandato na Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ). PT, PMDB, PP e PR se uniram para derrubar
proposta do deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA) determinando que, em caso
de condenação criminal, o presidente da Câmara decretaria a vacância do
mandato por ato de ofício, sem passar pelo plenário. A emenda foi
derrotada por 36 votos a 16. Ao rejeitarem a emenda Jutahy, os partidos
mira vam nos futuros processos de cassação.
Integrantes da base e da oposição diziam ontem que na CCJ houve
“acordão” para salvar o “bagrinho”, abrindo caminho para absolver os
mensaleiros e outros parlamentares com processos no STF. O deputado
Nélson Marquezelli (PTB-SP) foi um que alertou Henrique Alves de que, se
o caso Donadon fosse a plenário, o deputado escaparia no voto secreto.
— Alertei que, como há muitos deputados com problemas na Justiça, levar
a um confronto entre Câmara e Justiça, perderia a Justiça. Foi o que
aconteceu. A Mesa poderia ter evitado isso — disse Marquezelli.
Chico Alencar (PSOL/RJ) e Jutahy Júnior foram os únicos que se inscreveram para encaminhar a favor da cassação de Donadon.
— Houve uma coalizão contra o Congresso. Quando o Donadon falava, havia
um silêncio reverencial. O Henrique pediu para que respeitasse o prazo,
e o plenário começou a gritar: “Deixa ele falar!”. Quando eu comecei a
falar, gritavam: “Chega! Vamos votar!”. Era a impaciência do
corporativismo — contou Alencar.
Os líderes do PT, José Guimarães (CE), e do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), negaram a existência de acordão.
— A bancada do PT sozinha não consegue dar vitória a ninguém, muito menos a Donadon — disse Guimarães.
— Por que minha bancada? E os 108 que faltaram? O que houve foi uma reação de pena — disse Cunha.
Fonte: O Globo - Por Maria Lima, Evandro Éboli e Paulo Celso Pereira
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