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segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Feudo de deputados distritais

Levantamento feito pelo Correio mostra que 76% dos cargos das administrações regionais são ocupados por apadrinhados políticos, especialmente de parlamentares. Custo da máquina é desproporcional aos investimentos nas cidades

Área carente do Varjão: a cidade tem em sua administração apenas um concursado e 67 cargos de confiança

 

Criadas para aproximar o governo da comunidade e descentralizar as ações do poder público, as administrações regionais se transformaram em um cabide de empregos para funcionários comissionados indicados por políticos, principalmente por deputados distritais. Levantamento feito pelo Correio mostra que 76% dos cargos nas 31 administrações são ocupados por apadrinhados que não passaram por concurso público. Dos 3.526 contratados por esses órgãos, 2.692 foram indicados por critérios políticos, sem passar por seleção pública. Às vésperas de ano eleitoral, esse exército de comissionados é ainda mais valioso. O inchaço tem custos pesados: o gasto com pessoal supera os investimentos nas cidades realizados pelas administrações.

O orçamento das administrações regionais para este ano é de R$ 382,6 milhões. A previsão é de que a folha de pagamentos consuma 40% desse valor — um total de R$ 156 milhões. Para investimentos, como pequenas obras e melhorias para as regiões, o GDF previu R$ 146 milhões.

Em algumas administrações, como a de Brasília, os gastos com funcionários somam quase quatro vezes os recursos reservados para investimentos. No Plano Piloto, apenas 23 dos 168 servidores são concursados. O salário desses contratados custará aos cofres públicos R$ 6,1 milhões este ano. Para infraestrutura e benfeitorias, a verba é de R$ 1,6 milhão.

No Lago Norte, a manutenção da estrutura e do corpo de contratados também tem custo alto. A administração da cidade, localizada em uma das áreas mais nobres da capital federal, gasta quase 15% do orçamento só para pagar aluguel do prédio onde funciona a estrutura administrativa. Foram R$ 825 mil de locação e condomínio nos últimos 12 meses. Para investimento, está previsto pouco a mais do que isso: R$ 1,3 milhão.

O prefeito comunitário do Lago Norte, Dyonélio Francisco Morosini, reclama da falta de autonomia e de recursos da administração. “Uma parte dos impostos que os moradores do lago pagam deveria ir diretamente para a administração, para que fossem revertidos em benefícios para nossa região. Do jeito que as coisas funcionam, a administração é uma mera encaminhadora de pedidos ao governo. Não há recursos nem autonomia para realizar as obras que os moradores precisam”, reclama Morosini. “Além disso, a população deveria ter participação na escolha dos administradores. O governador escolhe sem ouvir a comunidade e, muitas vezes, indica pessoas que sequer moram na nossa região”, acrescenta o líder comunitário. 

Média

A média de funcionários concursados é de 25% em todas as administrações, mas há casos extremos como a do Varjão, que emprega um único servidor concursado e 67 comissionados. O administrador da cidade, José Ricardo do Nascimento, diz que essa estatística não atrapalha os trabalhos. “Quem ocupa o cargo tem que ter a responsabilidade de fazer o que tem que ser feito e aqui as pessoas encaram isso com seriedade. O que não pode faltar é a prestação de serviço à comunidade e, enquanto não sai concurso do governo, trabalhamos dessa forma”, explica José Ricardo, que foi indicado diretamente pelo governador Agnelo Queiroz. Para ele, o orçamento anual de R$ 1,1 milhão em 2013 não é insuficiente. “O Varjão tem apenas 9,5 mil moradores. Temos recursos para obras emergenciais e para executar prioridades da população, como quadras, calçadas ou reforma de escolas”, finaliza.

A nomeação de administradores regionais, além de abrir um leque gigantesco de cargos para acomodar aliados, também costuma alavancar personalidades das cidades para a política. O vice-governador Tadeu Filippelli (PMDB) e os deputados distritais Rôney Nemer (PMDB) e Alírio Neto (PEN), por exemplo, já foram administradores regionais antes de ganharem destaque na política local. O administrador de Ceilândia, Ari de Almeida, nega que o cargo tenha finalidade estritamente política. “São poucas as pessoas que começaram como administradores regionais e que ganharam projeção política na cidade. Recebemos muita cobrança da população e trabalhamos muito”, comenta Ari. Ele afirma que consegue driblar a falta de autonomia. “Aqui em Ceilândia, temos conseguido executar todos os nossos projetos, acho que isso depende muito do administrador”, acrescenta. 

Previsão legal 

A Lei Orgânica determina que o número de servidores concursados deve representar pelo menos 50% do quadro total do governo. No último levantamento, houve melhorias significativas, mas o GDF ainda não havia conseguido alcançar esse patamar. O número de servidores efetivos ocupantes de cargo em comissão passou de 60,6%, em 2011, para 54,8%, no ano passado. Apesar da queda do percentual, ainda falta ampliar o número de concursados para chegar ao patamar de 50%.

Distribuição

Administração    Total de     Número de
    funcionários    concursados


Ceilândia    249    79
Fercal    43    2
Águas Claras    116    36
Brasília    168    23
Brazlândia    118    45
Candangolândia    69    13
Itapoã    74    4
Paranoá    98    11
Planaltina    194    51
Samambaia    199     53
Santa Maria    170    35
São Sebastião    94    13
Sobradinho    180    53
Sobradinho 2    87    9
Taguatinga    255    108
Vicente Pires    78    8


Administração    Total de     Número de
    funcionários    concursados


Cruzeiro    81    15
Gama    198    73
Guará    178    46
Lago Norte    74    23
Lago Sul    77    13
Núcleo Bandeirante    100    35
Park Way    70     0
Riacho Fundo    99     15
Varjão    67    1
Jardim Botânico    82     15
Recanto das Emas    101    19
Riacho Fundo 2    78     12
SCIA    79    8
SIA    75    7
Sudoeste/ Octogonal    75    9
Total    3.526    834

Modelo questionado 

Publicação: 01/09/2013 04:00 

A Lei Orgânica do DF, sancionada em 1993, prevê a participação popular na escolha dos administradores . Mas, até hoje, a indicação continua sendo estritamente política. Em julho, o Ministério Público do DF e Territórios recomendou ao GDF que envie à Câmara Legislativa um projeto normatizando a participação popular no processo de escolha dos administradores regionais.

O Tribunal de Contas do DF também questiona o modelo. Na decisão em que aprovou as contas do governo de 2012 com ressalva, em junho, a Corte cobrou mudanças nas cidades. Segundo relatório do TCDF, “as ações empreendidas pelas administrações regionais foram insuficientes para garantir o cumprimento do papel institucional de representação do GDF como agente de descentralização e promoção de serviços públicos de sua competência”. Ainda segundo esse levantamento, “as vias pavimentadas e logradouros públicos não estavam adequadamente mantidos”. Até mesmo as atividades de aprovação de projetos e alvarás de obras e comércio, que são hoje as principais atuações das administrações, foram criticadas.

O coordenador das Cidades do GDF, Francisco Machado, explica que os administradores são os representantes do governador nas regiões. “É verdade que há dificuldades e que os recursos são limitados, mas uma boa administração é suficiente para gerir a cidade, manter a região limpa e com equipamentos conservados.”

Sobre o debate a respeito da ampliação da participação popular na escolha dos administradores, o coordenador afirma que Agnelo privilegia moradores das cidades e que ouve sempre a comunidade. “A participação popular é possível. A Lei Orgânica esboçou isso, mas nunca foi experimentado. Se houver toda essa autonomia que alguns defendem, daqui a pouco, haverá até Câmara de Vereadores , com mais gastos e burocracia. (HM). 

Fonte: Correio Braziliense - Por Helena Mader

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