Depois de sete anos, Câmara aprova, em segundo turno, fim do voto secreto
Unanimidade. Deputados festejam a
aprovação do fim do voto secreto, com 452 votos entre 453 presentes.
Todos votaram a favor, e apenas o presidente da Câmara, Henrique
Eduardo Alves (PMDB/RN) deixou de votar |
Seis dias após salvar o mandato do deputado-presidiário Natan Donadon
(sem partido-RO) em uma votação secreta, a Câmara dos Deputados tentou
dar ontem uma satisfação à sociedade e aprovou, em segundo turno, por
unanimidade, com 452 votos favoráveis, a Proposta de Emenda
Constitucional (PEC) 349, que põe fim ao voto secreto para todas as
decisões tomadas em sessões plenárias do Parlamento. A votação em
primeiro turno aconteceu há sete anos, e o texto segue agora para o
Senado, onde a tramitação deve demorar, no mínimo, um mês. Se aprovado
pelos senadores, todos os futuros processos de cassação de mandato
parlamentar terão o voto aberto dos seus colegas.
A decisão de pôr a medida em votação partiu do presidente da Câmara,
Henrique Eduardo Alves (PMDB/RN). Ainda pela manhã, ele chegou à Casa
informando que pautaria a proposta na sessão da noite e que informaria
aos líderes sua decisão. Henrique estava emparedado pela decisão do
ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, que na
segunda-feira suspendeu a decisão da Câmara que não cassou o mandato de
Donadon.
— Esta Casa marcou um passo ao reencontro da democracia — afirmou o
presidente, à noite, ao proclamar o resultado da sessão em que apenas
ele não votou. Apesar da aprovação da medida, existe na oposição o temor
de que o Senado demore na discussão da proposta, e ela acabe não sendo
votada. O receio aumentou diante da afirmação do líder do PMDB, Eduardo
Cunha (RJ), na tribuna, informando que, após a aprovação da PEC 349, seu
partido não aceitaria votar a PEC 196, que prevê o voto aberto apenas
na cassação de mandato de parlamentares.
— Não vamos fazer o papel de votar duas PECs, sendo a segunda mais restrita. Não vou enganar a opinião pública — afirmou Cunha.
Apesar de ser mais restrita, a PEC 196 já passou pelo Senado, já foi
aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, e agora
aguarda discussão e votação em comissão especial, e depois no plenário,
em dois turnos. Pelas contas de Henrique Alves, em duas semanas, a PEC
196 poderá ser pautada para o plenário e, caso aprovada, entrará em
vigor imediatamente.
Desconfiado, o líder da minoria na Câmara, Nilson Leitão (PSDB/MT),
disse, durante a sessão, que os partidos de oposição exigirão a votação
da PEC já aprovada pelo Senado, que servirá como garantia caso os
senadores demorem a analisar a proposta aprovada ontem pela Câmara:
— Isso é o jogo do Planalto. Vamos exigir a votação da PEC 196. Porque
votar apenas a PEC 349 é "me engana que eu gosto". Porque sabe-se lá
quando vai votar lá (no Senado).
Antes da votação final pelos deputados, à noite, o presidente do
Senado, Renan Calheiros (DEM/AL), gerando mais desconfianças, disse que a
Câmara deveria ter priorizado a medida mais restrita (já aprovada pelo
Senado) para só depois partir para a mais ampla, que deverá suscitar
debates:
— Nós já aprovamos a proposta há mais de um ano. O fundamental seria
votar essa matéria primeiro. Ela seria promulgada em oito dias. E,
depois, nós a ampliaríamos. A proposta votada ontem sofre restrições
mesmo entre os parlamentares que defendem o fim do voto secreto para
cassações de mandato. Isso porque a PEC abre o voto dos parlamentares em
situações delicadas, como apreciação de vetos presidenciais e
indicações de ministros do Supremo e do procurador-geral da República, o
que pode gerar, na visão deles, o risco de sofrerem retaliações por
parte do governo e de autoridades do Judiciário. Ainda durante a reunião
de líderes na Câmara, a avaliação final foi que o Senado terá a
oportunidade de fazer alterações na PEC.
Em plenário, muitos deputados diziam que não era possível votar ontem
contra a PEC do Voto Aberto, mesmo convencidos de que ficarão expostos
em algumas situações, como na apreciação dos vetos presidenciais.
— Curiosamente, alguns colegas passavam entre as bancadas fazendo
comício contra, dizendo que estávamos dando um tiro no pé — contou o
deputado Otávio Leite (PSDB/RJ).
Muitos usaram a tribuna para justificar por que estiveram ausentes na
votação da semana passada. Ontem, dos quatro deputados condenados no
caso do mensalão, apenas Pedro Henry (PP-MT) sentou-se no fundo do
plenário e votou. Já Valdemar Costa Neto (PR/SP) apenas registrou sua
presença ainda cedo. O petista João Paulo Cunha (SP) não registrou
presença, e José Genoino (PT/SP) está de licença médica.
O deputado Chico Alencar (PSOL/RJ), defensor do voto aberto em qualquer situação, ponderou:
— O parlamentar vai pensar duas vezes se fica bem com o governo, contra
sua consciência e contra a sociedade, ou se fica bem com seu eleitor. É
um teste à nossa independência.
Ontem, integrantes da Frente Parlamentar em Defesa do Voto Aberto,
criada em 2011, fizeram um ato em favor da PEC pelos corredores da
Câmara e terminaram com a abertura, no plenário, de uma enorme faixa
amarela e preta com o slogan "Voto aberto Já". O próprio Henrique Alves
posou para fotos ao lado deles afirmando que seria uma "sessão
histórica".
Durante a sessão, Alves foi criticado por alguns deputados, como Sílvio
Costa (PTB/PE), sugerindo que ele "estava jogando para a plateia". Mas,
ao iniciar a sessão de ontem, o presidente foi taxativo:
— Esta Casa não pode vacilar. O Brasil espera uma resposta que não pode
demorar deste Parlamento. Vi esta Casa se agachar, se levantar, mas não
vi um desgaste maior a essa Casa, à sua credibilidade do que o ocorrido
na noite fatídica da quarta-feira. O mea culpa é de todos nós.
A comissão especial que analisa a PEC 196 se reuniu ontem, mas ainda
precisa cumprir prazos para que ela seja levada ao plenário, o que deve
ocorrer no dia 24 de setembro. Integrante da comissão, o deputado Júlio
Delgado (PSB/MG) reclamou da decisão de privilegiar a PEC 349:
— O mais rápido é votar a PEC 196. É a resposta que a sociedade quer.
Na semana passada, no caso Donadon, quebraram o vaso. O vaso quebrou,
agora não adianta querer colar.
Por Paulo Celso Pereira, Isabel Braga e Cristiane Jungblut
Fonte: O Globo
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