Doleiro e agente aposentado da polícia civil presos em operação da PF levavam vida de luxo e riqueza
A Operação Miqueias, da Polícia Federal (PF), botou abaixo um
esquema suspeito de desviar R$ 50 milhões de fundos de pensão, mas,
para além das cifras financeiras, o que mais chamou a atenção foram
os alvos centrais da investigação: o doleiro de origem libanesa Fayed
Antoine Troboulsi e o agente aposentado da Polícia Civil de Brasília
Marcelo Toledo Watson, supostos chefes da organização, que estão no
centro de grandes escândalos nas duas últimas décadas na capital do
país.
A presença da dupla em novo escândalo envolvendo altas autoridades é
insólita porque os dois nunca fizeram questão de discrição. Eles
levavam uma vida de ostentação, cercados de carros de luxo e mulheres
bonitas. Não por acaso, entre os 24 detidos na operação estão quatro
modelos, suspeitas de prestar serviços para a organização.
- Brasília é a cidade mais vigiada do país e, mesmo assim, o grupo
se manteve em atividade e fez muitos negócios. É de se imaginar que
tinha forte proteção política - diz um promotor da linha de frente
das investigações.
Toledo foi um dos agentes públicos fisgados na Operação Caixa de
Pandora, investigação da PF e do Ministério Público do Distrito
Federal que levou à renúncia os ex-governadores José Roberto Arruda e
Paulo Octávio. Toledo era um dos operadores do chamado mensalão do
DEM. Cabia ao policial arrecadar e repassar parte do dinheiro ao grupo
político de Arruda, no escândalo que sacudiu as estruturas políticas
de Brasília em 2009.
Imagens do policial movimentando parte do dinheiro de origem ilegal
foram gravadas pelo ex-secretário de Relações Institucionais Durval
Barbosa que, depois de romper com Arruda, denunciou o esquema. O vídeo
de Toledo, que fazia parte de uma coleção de mais de 40 peças
entregues à polícia, foi um dos que mais fizeram sucesso na internet.
Mas a ampla publicidade do caso e o peso da investigação da PF não o
intimidaram.
Ainda sob investigação na Caixa de Pandora, Toledo se envolveu em
outro episódio, batizado de "Sudoeste Caboclo", que mexeu com os nervos
do governo Agnelo Queiroz (PT). O agente quase trocou tiros com o
soldado da PM João Dias, numa padaria do Sudoeste, bairro de classe
média de Brasília. A briga entre um agente e um soldado não teria
nada demais se não fosse um pequeno detalhe: lutavam pelo controle de
diretorias do Banco de Brasília e da DF Trans.
A espantosa fonte de poder dos dois, um agente e um soldado
investigados por denúncias de corrupção, estaria no submundo de
campanhas eleitorais, a última delas para o governo local. A Polícia
Civil abriu inquérito para apurar a troca de ameaças e o jogo de
chantagens que, naquele momento, se configurava como um novo escândalo
na capital, mas as investigações não foram levadas adiante e até
hoje as cenas do faroeste entre Toledo e João Dias não foram
devidamente explicadas.
Na semana passada, Toledo voltou ao noticiário. Ele, Fayed e o
economista Carlos Eduardo Lemos foram presos como suspeitos de chefiarem
uma organização especializada em golpes contra fundos de pensão e
lavagem de dinheiro. Pelas informações da polícia, a estrutura
movimentou nos últimos anos nada menos que R$ 300 milhões. A
lavanderia teria tratado até de dinheiro do tráfico de drogas, segundo
a delegada Andréia Pinho Albuquerque, coordenadora da Operação
Miqueias.
O histórico de encrencas de Fayed com a polícia é ainda mais longo
que o do sócio. O libanês começou a se projetar como o grande doleiro
de Brasília ainda nos anos 90, depois do assassinato de um outro
famoso doleiro local. O nome de Fayed apareceu em investigações de
irregularidades no pagamento de precatórios durante o governo do
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O doleiro teria se envolvido na
lavagem de dinheiro de assessores do ex-ministro dos Transportes Eliseu
Padilha (PMDB).
O nome de Fayed reapareceu numa investigação do Ministério Público
Federal sobre uso de dinheiro público na campanha do ex-governador
Joaquim Roriz em 2002. Em março, o doleiro passou 26 dias preso. Ele
era um dos alvos de investigação sobre lavagem de dinheiro envolvendo o
Ceilândia Esporte Clube, um time de futebol local. Na mesma
operação, dois delegados foram presos por supostas ligações com o
doleiro. O caso ainda não foi concluído e o doleiro está novamente na
cadeia.
A fama e a fortuna de Fayed e Toledo cresceram na mesma proporção dos
escândalos da política em Brasília. A PF e o MP do Distrito Federal
ainda tentam levantar os bens dos dois que estariam, em boa parte, em
nome de terceiros. Mas os sinais de riqueza saltam aos olhos. Entre os
bens de Fayed apreendidos pela PF está um iate de R$ 5 milhões e duas
Ferraris, cada uma avaliada em mais de R$ 1,5 milhão.
O doleiro também seria dono de um jato Phenom 100, fabricado pela
Embraer entre 2010 e 2011. O jato está avaliado em US$ 4 milhões. Numa
das conversas gravadas pela PF, Fayed acerta com um amigo a
contratação de um piloto para o avião por R$ 10 mil mensais, conforme
consta em relatório do MP obtido pelo GLOBO. Ao todo, a polícia
apreendeu 20 carros de luxo, uma moto e o iate. O avião não foi
localizado.
O advogado de Fayed, Celso Lemos, reconhece a longa ficha do doleiro, mas diz que as acusações são exageradas.
- Ele não tem responsabilidades com essa amplitude toda que estão
atribuindo a ele. (As denúncias) são coisas da província - disse o
advogado.
O GLOBO tentou, mas sem sucesso, falar com o advogado Raul Livino, encarregado da defesa de Toledo.
Fonte: O Globo - Por Jailton de Carvalho