Em entrevista ao blog, o presidenciável tucano Aécio Neves disse que o
governo de Dilma Rousseff está “paralisado”, a fama de boa gerente da
presidente revelou-se “um mito” e a administração petista, acometida de
“fadiga do material”, atravessa “um fim de ciclo.”
“Se vamos ser nós que vamos sucedê-los, o tempo é que vai dizer. Mas
está claro que o governo perdeu a capacidade de tomar iniciativas”,
afirmou Aécio. Ele considera “legítima” a movimentação de Eduardo
Campos, governador de Pernambuco e presidente do PSB. “Não gosto dessa
dicotomia de PSDB e PT. Acho que o aumento do leque de opções ajuda nas
decisões.”
De resto, critica a interferência de Dilma no processo eleitoral de
Belo Horizonte. “Enxergaram o fantasma de 2014 em Minas. Estão me
valorizando mais do que eu mereço”, ironizou. Vão abaixo, subdivididas
em tópicos, as opiniões de Aécio Neves:
- Avaliação do governo Dilma: O governo parou. Digo
uma coisa que nem deveria dizer, mas o governo do Lula era melhor do que
o governo da Dilma do ponto de vista dos resultados. As pessoas faziam
algumas coisas. Agora, no setor de infraestrutura, que já não andava
bem, não acontece absolutamente nada. Na área da saúde, o governo
investe 10% a menos do que investia há dez anos. Na hora que começarem a
comparar os indicadores, num ambiente econômico que já não será de
euforia, mas de extrema preocupação, as pessoas vão perceber que
caminhamos para um fim de ciclo.
- Avaliação do desempenho da presidente: A fama de
boa gerente da Dilma era um mito. Aquela imagem de administradora capaz é
a que vai sair mais machucada desse período de crise. O sentimento
generalizado, mesmo na base do governo, maior ainda entre os
empresários, é o de que este é um governo paralisado. Isso vai ficando
cada vez mais claro. O governo não fez as grandes reformas que deveria
ter feito. Faltou ousadia, faltou coragem.
- Imagem do Brasil no exterior: Estive por dois dias
em Washington, para a premiação do Fernando Henrique [prêmio John W.
Kluge, de US$ 1 milhão, dado pela Biblioteca dos EUA]. Conversei com
amerianos importantes, que acompanham a realidade brasileira. Falei com
economistas da Europa, que estavam lá. A expectativa em relação ao
Brasil é outra, totalmente diferente do que era há seis meses. Há, hoje,
uma avaliação mais negativa sobre a capacidade do país de responder à
crise. O ambiente econômico piorou e a visão geral é de que vai piorar
mais.
- Fim de ciclo: Estamos ingressando numa fase de fim
de ciclo. Esse ciclo atual da administração do PT, na minha avaliação,
vai se encerrar. Se vamos ser nós que vamos sucedê-los, o tempo é que
vai dizer. Mas está claro que o governo perdeu a capacidade de tomar
iniciativas. A base política no Congresso está extremamente esgarçada.
Nesta semana, o governo não conseguiu nem votar a LDO [Lei de Diretrizes
Orçamentárias].
- Tempo perdido: É nos dois primeiros anos de um
governo que devem ser feitas as grandes reformas. O governo não fez. E
agora está patinando. Acho que ganha força um discurso alternativo pela
eficiência. Essa mácula da ineficiência a Dilma vai carregar. O governo
dela parou. Não sou do tipo de pessoa que torce contra. Isso quem faz é o
PT. Mas é preciso dizer as coisas com clareza. E nós vamos dizer, no
momento próprio. Não queremos confundir eleições municipais com o
cenário nacional. Não se trata de desconhecer o que eventualmente tenha
dado certo. Não faço o discurso da negação. Não se pode dizer que, do
Lula pra cá, tudo deu errado. Respeito o que deu certo. Mas estamos
chegando ao fim um ciclo. É preciso que se inicie outro.
- O que faria de diferente se fosse presidente? No
primeiro dia, apresentaria uma agenda com duas ou três grandes reformas
que eliminassem nossos grandes gargalos. As coisas não mudam do dia para
a noite. Mas, já no início do governo, eu estaria propondo ao país
essas reformas. A começar pela reforma do Estado, com uma grande
diminuição do seu peso. É preciso abrir espaço fiscal para que haja, aí
sim, o início de uma redução da carga tributária. A carga de tributos é
um dos principais fatores que inibem a competividade do Brasil. Não
adianta tomar essas medidas paliativas de conceder isenções pontuais
para setores específicos, como o automobilístico. Tem que puxar para
baixo a carga de tributos de todos os setores.
- Reforma politica: Esse é outro tema ao qual eu me
dedicaria desde o primeiro dia. Eu iria para o Congresso fazer o que a
Dilma não fez: negociar dois ou três grandes pontos que organizassem
minimamente o quadro partidário brasileiro. Tínhamos que ter buscado uma
aliança política possível, para termos o inverso do que o STF acaba de
fazer. Em vez de aumentar, precisamos enxugar o quadro partidário,
adotando a cláusula de desempenho, o voto distrital misto. Essa decisão
do Supremo [que reconheceu ao PSD o direito de partilhar do tempo de
tevê e das verbas do Fundo Partidário] já está causando um dano enorme
ao país. Agora, um deputado tem preço. Elege-se por um partido e leva os
votos para outro. Conforme o tempo de tevê da nova legenda, cada
deputado vale X. Um partido de 12 deputados vai valer um preço nas
coligações nacionais e outro preço nas coligações estaduais. Agora, 12
picaretas podem se juntar para formar um partido, calcular o valor de
cada deputado conforme o fundo partidário e, depois, vender o tempo de
televisão nas eleições.
- Descentralização administrativa: Essa agenda dos
primeiros dias de governo teria de incluir uma política de
descentralização corajosa em relação a Estados e municípios. Dá pra
fazer. Na área de transportes, por exemplo, hoje não se faz nada. Por
que não distribuir para os Estados a administração de rodovias federais,
com a transferência dos recursos da Cide e de parte do Orçamento da
União? Essa centralização do poder, para ter ganho político, é um dos
maiores equívocos que os governos do PT cometem. Concentram em Brasília
um poder enorme e não conseguem gerir. Esse processo vem se agravando
nos últimos anos. Acentuou-se com a Dilma.
- Fadiga do material: O governo enfrenta o fenômeno
da fadiga de material, comum nas administrações longas que perdem a
capacidade de se renovar. Acho que eles chegarão cansados [a 2014]. Para
botar uma máquina gigantesca como essa para rodar leva tempo. E o
governo, até aqui, só perdeu tempo. Qual é o objetivo desse governo?
Hoje, o único objetivo é a manutenção do poder a qualquer custo. A
capacidade de tomar iniciativas, de fazer do governo uma estrutura
pró-ativa, tudo isso desapareceu. Se a economia estivesse muito bem,
talvez isso fosse minimizado. Mas o cenário inspira preocupação: a base
política está desagregada não se gosta e não se articula; a economia
emite sinais negativos, apontando para o aumento do desemprego; oas bras
de infraesturura não acontem; os indicadores sociais patinam. Insisto:
vivemos um fim de ciclo.
- Movimentação de Eduardo Campos: É absolutamente
legítima a movimentação dele. Acho que ajuda. Não gosto dessa dicotomia
de PSDB e PT. O aumento do leque de opções [presidenciais] ajuda nas
decisões. Convém não esquecer que muitas seções regionais do PSB
[partido presidido por Eduardo] são aliadas do PSDB. A começar pelo
Paraná e por Minas Gerais. Mesmo em São Paulo, tirando esse apoio ao
Fernando Haddad, que o Eduardo determinou, o PSB é aliado do Geraldo
[Alckmin, governador tucano]. De baixo pra cima, haverá sempre setores
do PSB com identidade maior conosco. Mas temos que respeitar e
reconhecer que o Eduardo faz uma movimentação correta. Não contamina o
processo. Ao contrário, apresenta um espaço de discussão novo. Tenho com
ele as melhores relações. Eu o respeito muito.
- 2014 se imiscuiu em 2012? Não vejo isso com tanta
clareza assim. É claro que algumas coincidências levam a essa leitura,
sobretudo o que aconteceu em Recife, Fortaleza e Belo Horizonte. Mas, se
formos analisar friamente, essas três situações mais emblemáticas, que
envolvem o PSB, ocorreram por questões absolutamente locais. Em
Fortaleza há um litígio do Cid e do Ciro Gomes [do PSB] com a prefeita
Luizianne Lins [do PT]. Se houvesse harmonia entre eles, a ruptura
talvez não tivesse acontecido. Em Recife, o Eduardo [Campos, do PSB]
tentou construir a candidatura do Maurício Rands [do PT]. Não conseguiu.
Veio outro nome [o petista Humberto Costa]. E o Eduardo optou pela
candidatura própria [de Geraldo Júlio]. Em Belo Horizonte, depois de
integrar a gestão do Márcio Lacerda [do PSB] por quatro anos, o PT
arranjou um pretexto para romper. Não fomos nós que nacionalizamos a
campanha em Minas, mas o PT, que chegou a um nome a partir de
interferências externas.
- Vaivém do PT em Belo Horizonte: O PT dizia que o
Márcio [Lacerda] rompeu a aliança. Isso não existe. Tanto é que eles
pararam de dizer isso. Na verdade, houve um rompimento do PT com o
Márcio. O PT tinha a vice-prefeitura e controlava 70% dos cargos da
prefeitura. Esse negócio de coligação proporcional [na chapa de
vereadores] foi um pretexto. Nós reivindicamos fazer coligação
proporcional, o PT também. O PSB disse o seguinte: vamos sair com uma
chapa sozinhos, para poder eleger uma bancada de apoio claro ao
prefeito, do partido do prefeito. Nós topamos até isso, mesmo não tendo a
vice. E o PT falou: ‘Não, nós queremos os votos do PSB para eleger uma
bancada maior do PT. Para quê? Para o Márcio ficar refém deles.
- Intervenção federal em Belo Horizonte: Depois de
romper a aliança, o PT lançou a candidatura do Roberto Carvalho. O
Gilberto Carvalho [amigo de Lula e ministro-chefe da Secretaria-Geral da
Presidência sob Dilma] baixou aqui em Belo Horizonte, na terça-feira da
semana passada, na base aérea, para convencer o Roberto Carvalho, em
nome do Lula e da Dilma, a desistir da candidatura, que já tinha sido
inclusive registrada. Ele saiu com a promessa de sabe-se lá quais
vantagens. Aí começou a nacionalização da campanha em Minas. Foi
iniciada por eles, não por nós. Para ter o PMDB [na coligação do PT], a
Dilma entrou pessoalmente no processo, intercedendo junto ao Michel
[Temer, vice-presidente da República e presidente licenciado do PMDB]. O
Leonardo Quintão [que abdicou da candidatura a prefeito pelo PMDB] está
achando que vai ser ministro. No PCdoB, a direção municipal votou pela
coligação com o Márcio. Veio um comando de cima, do Renato Rabelo
[presidente nacional do PCdoB], dizendo que não podia. E o partido
voltou atrás. A pedido da Dilma o [Gilberto] Kassab [prefeito de São
Paulo e presidente do PSD federal] interveio em Minas. Vai se dar mal. O
PSD vai ficar conosco. O apoio deles ao Márcio foi decidido em
convenção. O estatuto do PSD diz o seguinte: qualquer intervenção só
pode ser feita pela Executiva do partido. E a executiva não se reuniu.
Em Belo Horizonte, o PSD é adversário do PT.
- A entrada do petista Patrus Ananias na briga pela prefeitura:
Reconheço que ele tem uma imagem positiva e que o cenário exigirá de
nós mais atenção e mais trabalho. Mas acho que ele vai ter dificuldades.
Está desatualizado sobre Belo Horizonte, não morava aqui há muito
tempo. Esteve em Brasília durante os últimos sete ou oito anos. E o PT
terá enorme dificuldade para justificar a mudança de posição. Na manhã
do dia 30, na convenção do PSB, estavam todos lá, a começar do
[Fernando] Pimentel [ministro do Desenvolvimento de Dilma]. Nessa hora, o
Márcio era o melhor prefeito do Brasil. À noite, decidiram romper e o
Márcio passou a ser o demônio. Será muito difícil o PT explicar por que
deseja agora a interrupção de uma administração municipal muito bem
avaliada, da qual participou durante quatro anos.
- Fantasma de 2014? Por que o PT mudou de posição em
Belo Horizonte? Prevaleceu o interesse do PT em 2014. Enxergaram o
fantasma de 2014 em Minas. Estão me valorizando mais do que eu mereço.
Para fazer essa movimentação toda, com todos os riscos que correm, é
porque estão vendo 2014. A Dilma não precisava intervir, poderia ter
mantido o discurso dela de não envolver a estrutura federal nas eleições
municipais. Nós continuaremos voltados para os interesses de Belo
Horizonte. Deixaremos a nacionalização para eles, que construíram uma
candidatura fora de Minas, no eixo Palácio do Jaburu-Planalto-São Paulo.
Em 2010, aconteceu algo parecido na eleição de governador. O Lula [que
apoiava Hélio Costa, do PMDB, contra Antonio Anastasia, candidato de
Aécio] vinha para Minas raivoso. Eu disse naquela época: o mineiro tem
uma tradição de ser povo hospitaleiro, recebe muito bem. Mas na hora de
definir os seus destinos, o mineiro sabe fazer suas escolhas sozinho,
não precisa de conselhos externos.
- Mas Dilma Rousseff não nasceu em Minas? Ela é uma mineira curiosa, que acomodou oito gaúchos no ministério [risos].
Fonte: Blog do Josias - UOL
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