Um político militante, deputado ou senador, seguramente não é a pessoa mais indicada para julgar as contas dos governos. De modo geral não estão preparados para isso e levam para os tribunais de contas seus métodos e vícios da atuação político-partidária. Políticos não deveriam ser ministros ou conselheiros de tribunais de contas. Essa importante função deveria ser reservada a pessoas capacitadas e preparadas, recrutadas por concurso público e sem filiação partidária.
Mas se alega que a essas pessoas falta visão política, que os tribunais de contas devem ser uma mescla de políticos e técnicos. Ora, um técnico pode ter visão política, sim, o que é bem diferente da visão partidária que têm os políticos tradicionais. Visão política, aliás, no sentido amplo do termo, é o que muitos políticos não têm.
Em defesa da presença de políticos nos tribunais de contas alega-se também que esses órgãos contam com quadros de excelentes auditores e assessores, que preparam os pareceres técnicos que serão levados aos ministros e conselheiros. Então não seria mais eficiente e econômico que um corpo de auditores decidisse sobre as contas, em vez de preparar a cama para o político? Com um problema adicional: por razões “políticas”, o político muitas vezes contraria o parecer técnico.
Os constituintes de 1988, legislando em causa própria, decidiram que o Congresso indica seis dos nove ministros do Tribunal de Contas da União. Os deputados indicam três, os senadores outros três. Ao presidente da República cabe indicar três, mas um deles dentre os auditores do tribunal e um dentre os procuradores. De livre vontade, indica um.
Deputados e senadores, na maior parte das vezes, escolhem um colega para a função. Para obter essa indicação, os parlamentares fazem acordos e promessas, como numa campanha eleitoral. O governo, por sua vez, indica pessoas de sua confiança. E assim os ministros – fora o auditor e o procurador, às vezes até eles – chegam ao tribunal repletos de compromissos e acordos.
A indicação para o TCU vira disputa político-eleitoral. Agora mesmo, quando há uma vaga a ser preenchida pela Câmara, há dez deputados se candidatando. Entre eles, parlamentares respeitados, como a pernambucana Ana Arraes (PSB) e o paranaense Osmar Serraglio (PMDB). Os outros estão entre os nem tão respeitados e os mais que envolvidos em falcatruas.
Mas a questão não é essa. Ana Arraes e Serraglio foram eleitos para a Câmara, não para abandonar seus mandatos e assumir a função vitalícia com salário de R$ 25 mil (menor do que o que já recebem) e aposentadoria integral, além das muitas mordomias inerentes à alta burocracia federal. Cumprem bem os mandatos, e deveriam continuar a exercê-los.
É querer demais, mas a Câmara poderia deixar o corporativismo de lado e escolher o auditor Rosendo Severo, indicado pela União dos Auditores Federais de Controle Externo e apoiado pela Ordem dos Advogados do Brasil, pelo Movimento Ficha Limpa e pelo Instituto Ethos. Severo, auditor há 20 anos, precisa ser indicado por um partido político e eleito pelos deputados, e para manter sua independência não poderia fazer barganhas.
Muito difícil acontecer isso. Mas seria um sinal positivo para a sociedade e um passo importante no combate à corrupção. Se deputados estivessem preocupados com essas coisas.
Provavelmente o indicado será um deputado. Mas, de qualquer maneira, vale a intenção dos auditores e de setores da sociedade de mostrar que há outras maneiras de fazer as coisas, fora dos velhos métodos e da politicagem tradicional.
Fonte: Publicado em Brasil 247, em 27.7.2011
Blog do Hélio Doyle
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