Com empate em 4 a 4, Celso de Mello decidirá se parlamentares devem perder o mandato
O Supremo Tribunal Federal (STF) caminha para decidir amanhã que cabe à própria Corte, e não à Câmara, decretar a perda de mandato dos três deputados condenados pelo men-salão. Após dois dias de discussão, o placar ficou em quatro votos a quatro. Celso de Mello vai desempatar a votação. Ao longo dos debates, já indicou que a última palavra é do STF, como defendeu o relator do processo e presidente do tribunal, Joaquim Barbosa. Estão com o mandato ameaçado João Paulo Cunha (PT/SP), Valdemar Costa Neto (PR/SP) e Pedro Henry (PP/MT). O entendimento do Supremo será oposto ao do presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), para quem a Constituição determina que a palavra final é do Poder Legislativo.
Para o revisor do processo, Ricardo Lewandowski, Maia está correto. O
revisor entende que a cassação de mandato é um assunto político e, por
isso, a decisão caberia à Câmara. Relator e revisor votaram na semana
passada.
Ontem, o julgamento foi retomado com o voto da ministra Rosa Weber, que
acompanhou Lewandowski. Segundo ela, emenda feita em 1996 ao Código
Penal estabelece que a perda de mandato é um efeito automático da
condenação. A Constituição, por outro lado, estipula que a cassação
precisa passar pela Câmara. Assim, entre os dois textos, deve prevalecer
a Constituição, a lei maior do país. Rosa destacou que a primazia de
decidir sobre o mandato é do povo, por meio de seus representantes
eleitos.
— Tratando-se de cassação de mandato, a competência é do mandante,
daquele que o investiu. Não cabe, na minha compreensão, ao Poder
Judiciário fazê-lo, porque a disposição do mandato é exclusiva dos
eleitores, que se manifestam, decidem por meio de seus representantes
eleitos — afirmou Rosa Weber.
Em seguida, votou o ministro Luiz Fux, que seguiu Joaquim. Ele citou a
Lei da Ficha Limpa, que surgiu a partir de um projeto de iniciativa
popular, para rebater os argumentos contrários.
— Será que esse movimento popular que fez surgir a Lei da Ficha Limpa
entende que é legítima a concessão de uma autorização para que os
parlamentares possam praticar os seus atos contrários à lei e, ainda
assim, manter a higidez da representatividade popular? Eu entendo que
absolutamente não é possível — disse Fux.
Dias Toffoli votou com o revisor. Ele também destacou a representatividade popular do parlamentar para justificar sua posição.
Após o voto de Toffoli, ocorreu intensa discussão. Foi quando Celso de
Mello, já deixando seu voto à mostra, defendeu o poder do Supremo para
determinar a perda do mandato.
— O Congresso Nacional não pode interferir nos efeitos que resultam de
uma condenação penal transitada em julgado proferida no Supremo Tribunal
Federal. Mas também não pode intrometer nas consequências dos efeitos
extrapenais. E os efeitos extrapenais, nos termos da própria
Constituição, é a privação da cidadania, é a suspensão dos direitos
políticos — destacou o ministro, em resposta aos argumentos do revisor.
Joaquim também se manifestou:
— Causa-me espécie e desconforto a perspectiva de dizermos ao Congresso Nacional que uma pessoa condenada à privação de liberdade por dez, 14 anos possa exercer o mandato — acrescentou o relator.
A ministra Cármen Lúcia acompanhou Lewandowski. Ela afirmou que todos
concordam que a condenação é incongruente com o exercício parlamentar,
mas frisou que a cabe ao Congresso decidir pela perda do mandato. Ela
também disse que o STF deve esperar responsabilidade da Câmara para que
haja a cassação.
— Nem acho nem me parece que vá deixar de acontecer (a cassação), em
que pese teoricamente até poder (ocorrer). Mas acho que, num sistema de
uma República na qual um de seus esteios é a legalidade e outro é a
responsabilidade, há de se esperar responsabilidade de todos os Poderes,
como esperam de nós e nós estamos cumprindo — avaliou Cármen Lúcia.
Para Gilmar Mendes, que concordou com o relator, seria uma
incongruência a Lei da Ficha Limpa impedir a candidatura de políticos
condenados mesmo sem sentença definitiva; e o STF permitir que
condenados definitivamente em ação penal continuem a exercer o mandato.
— A Lei da Ficha Limpa impede que o sujeito excluído da OAB, ou que
teve contas rejeitadas, ou que teve sentença condenatória proferida por
colegiado possa ser candidato; mas condenado em processo penal no
Supremo manteria o mandato — argumentou.
Ele ainda ressaltou a incompatibilidade de um preso exercer atividade parlamentar.
— Se há algo que se pressupõe no exercício do mandato é a ideia de
liberdade. Nós temos um deputado preso com trânsito em julgado. Veja
tamanha incongruência em casos desse tipo — completou Gilmar Mendes. •
OS VOTOS DOS MINISTROS
Pela palavra final do STF
JOAQUIM BARBOSA - O relator defendeu a perda automática do mandato. Para
ele, as penas aplicadas aos réus são incompatíveis com o exercício da
função parlamentar. Também entendeu que a conduta dos deputados
-condenados por corrupção passiva - não condiz com os deveres do cargo.
LUIZ FUX - Apoiou Barbosa. Segundo ele, o povo tem uma concepção mais
rigorosa da política depois da aprovação da Lei da Ficha Limpa, que
impede políticos condenados de se candidatar a mandato eletivo.
GILMAR MENDES - Também citou a Ficha Limpa para sustentar a mesma posição
do relator. Para Gilmar, uma lei que impede a candidatura de condenados
não poderia conviver com eventual decisão do STF de permitir a
continuação do exercício do mandato.
MARCO AURÉLIO - Argumentou que uma decisão da mais alta Corte do país não pode ficar sujeita ao aval político. “0 primado do Judiciário afasta por completo a possibilidade de uma decisão ficar submetida a uma condição resolutiva que encerra uma definição em si política” disse o ministro.
RICARDO LEWANDOWSKI - O revisor entendeu que a perda do mandato não é automática e que a Constituição entrega à Câmara a tarefa de decidir se os deputados devem ser cassados ou não. Para ele, o exercício do mandato atual não pode ser confundido com a proibição de se candidatar.
ROSA WEBER - Ao seguir o revisor, a ministra observou que a Constituição
estipula que a cassação deve ser decidida pela Câmara. Destacou que
cabe ao povo, por meio de seus representantes eleitos, decidir se o
deputado deve ou não manter seu mandato.
DIAS TOFFOLI - Entendeu que cabe à Câmara deliberar sobre o assunto e
destacou que o parlamentar é representante do povo. “O que se protege
ali não é a pessoa física do parlamentar, mas a sua representatividade”.
CÁRMEN LÚCIA - Destacou que a condenação não condiz com o exercício do mandato, mas ressaltou que cabe à Câmara decidir sobre a cassação. Disse ainda que a Câmara terá responsabilidade para determinar a perda do mandato.
Ministro altera voto e absolve acusados por quadrilha
Fonte: O Globo

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