Numa de suas peças mais festejadas, o cronista e dramaturgo Nelson Rodrigues colou no amigo Otto Lara Resende uma frase-chiclete, dessas que não desgrudam jamais: “O Otto Lara está certo. O mineiro só é solidário no câncer”.
“Bonitinha, mas ordinária”, eis o nome da peça. Otto foi conferir, num teatro do Rio, em 1991. Comentaria a experiência numa crônica de jornal: “Saí como se tivessem me pregado um rabo de papel”.
Vivo, Nelson Rodrigues teria de injetar em sua frase um adendo. Ficaria assim: “O Otto Lara e o Geraldo Alckmin estão certos. O mineiro e o paulista só são solidários no câncer.”
Antagonista de Lula, o governador tucano Alckmin visitou-o no hospiral Sírio Libanês. O ex-soberano petista saía de sua sessão diária de radioterapia. Conversaram por cerca de 20 minutos.
Além do rival, Lula recebeu o companheiro Fernando Lugo. Recém saído de uma peleja contra um câncer lifático, o presidente paraguaio veio a São Paulo para fazer exames rotineiros. Conversaram a três por cerca de 20 minutos.
Congelado numa foto, o encontro foi pendurado no site do Instituto Lula num instante em que PT e PSDB se equipam para a guerra municipal de 2012.
Como que dotados de poderes divinos, os contendores lançarão uns sobre os outros alguns trovões e muitos raios que os partam.
Contra esse pano de fundo envenenado, a foto proporcionada pelo câncer funciona como prova documental de que, mesmo atrás da política, esconde-se uma dimensão do humano.
Como qualquer pessoa, o político é convidado de vez em quando a reconhecer-se como uma criatura inviável.
Poderosos ou impotentes, estamos todos na fila do inevitável, esperando a hora de sair de cena.
Ou de ser arrancado dela. Vem daí que, no câncer, até Nelson Rodrigues seria um solidário jucundo.
Fonte: Blog do Josias - UOL
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